segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Paraguay Parte V ''a gente sofre mas a gente ri''

Acho muito engraçado quando lembro das coisas que ouvi a respeito do Paraguay ao sair do Brasil. A maioria eram piadinhas bobas, mas que escondem preconceitos sérios, idéias distorcidas sobre um país vizinho vazio, sem história, sem cultura, sem dinheiro, sem poder, sem cérebro. Uma nação onde tudo se resume a muamba, contrabando e falsificação. É natural, confesso que também carregava muitos preconceitos e que sabia quase nada sobre a história Paraguaya. Não sabia, por exemplo, que a ditadura do general Alfredo Strossner foi a mais longa da América Latina, punindo o país durante trinta e cinco anos. A ciudad del Leste, da ponte da amizade (da parte onde parte dos preconceitos se justifica), se chamava Puerto de Strossner até sua queda em 1989, qundo houve um golpe de estado para retirar o ditador do poder, liderado pelo também militar Andrés Rodríguez. Strossner recebeu exílio em Brasília onde viveu até 2006, quando morreu doente. O partido colorado, de extrema direita, deitou e rolou no poder por mais de sessenta anos. Assim, a eleição de Fernando Lugo representa aqui a primeira grande mudança política no país. Tá que Lugo está envolvido em escândalos sexuais, coisa e tal, mas ainda assim é uma figura forte, com um carimbo de ‘’democracia’’ estampado na testa. Isso me lembra uma piadinha paraguaya muito boa. Na sua campanha presidencial, havia um jingle que dizia que Lugo tem coração. Depois das denúncias de que o bispo havia engravidado moças, o povo mudou o jingle para ‘’Lugaucho (o mesmo que mulherengo) tiene corazón, pero no usa condón!’’ (tem coração, mas não usa camisinha).É aquela história...a gente sofre mas a gente ri. Eu achei estranho o Brasil ter dado exílio político ao Strossner. Na verdade, eu acho estranho como que os paraguayos não odeiam o Brasil. Fora o genocídio na desastrosa guerra da tríplice aliança (que nós chamamos de guerra do Paraguay), o Brasil mantém até hoje o tratado de Itaipu, herança dos tempos da ditadura que é um tanto quanto injusta. Apesar de ser uma hidrelétrica considerada binacional, o Paraguay só faz uso de duas turbinas e é obrigado a vender o seu excedente ao Brasil a preço de banana, isso até 2023, pelo menos. Enquanto a gente tem o costume de meter o pau nos paraguayos, eles, que têm motivos para nos detestar, nos adoram e só pedem por justiça, nada mais. Quando discuto essas questões com o pessoal daqui, juro que dá vergonha de já ter tido uma cabeça tão pequena sobre esse país, sobre esse povo. Grande parte dessas histórias que eu contei aqui eu vi num documentário excepcional, chamado ‘’Paraguay, mi tierra olvidada’’ (Paraguay, minha terra esquecida). Aliás, essa semana está tendo aqui o festidoc, um festival de documentário sensacional, mas que infelizmente coicide com meus horários de aula, então quase não tá dando preu aproveitar. Assisti também ‘’La ciudad de los fotógrafos’’, um filme chileno sobre os fotógrafos independentes na ditadura de Pinochet; ‘’La otra copa’’, argentino, muito divertido, sobre a copa do mundo de moradores de rua (que eu nem sabia que existia) e ‘’Vengo de un avión que cayó en las montañas’’, particularmente, o meu favorito. O documentário uruguayo/francês é uma coletânea de depoimentos de sobreviventes ao acidente aéreo, aquele que caiu nos Andes em 72. Os relatos são impressionantes, fiquei muito emocionada. Olha que eu sou difícil de fazer chorar em filme. Tem uma hora que eles estão descrevendo como que organizavam expedições, com o intuito de encontrar ajuda e então um dos caras narra que o único objetivo dele era andar na neve, dormir e continuar andando no dia seguinte. A noite era extremamente gelada então ele só conseguia dormir no meio do nada porque a exaustão o obrigava. Acordava com o sol batendo em seu rosto. É muito bonito, ele descreve esse sol como uma mão de Deus, que fazia com que ele tivesse esperança, tivesse paz, por alguns segundos. É incrível como o cara nessa situação horrível consegue se alegrar, se apoiando numa fé inventada por ele, para ele. A sobrevivência inverossímel dessas pessoas, durante 72 dias no meio do nada, comendo pasta de dente como sobremesa, me fez me sentir minúscula, uma gotinha d’água na tempestade. Me fez olhar para muitas coisas que eu dou um valor gigante de outra forma, mais pé no chão. Esse documentário é incrível...Eu recomendo.

Aqui em Asunción os cassinos e bingos são legais. Eu nunca havia entrado em um cassino e assumo que fiquei me sentindo bem hollywoodiana no ambiente. Quem nos levou foi o Guille, mi hermanito, primeiro secretário e guia de baladas e perdições asuncionenses. Estávamos procurando um bar pra beber na cidade, e em todos que passávamos estavam meio as traças, com pouquíssimas pessoas. Foi quando o Gui sugeriu tomar uma cerveja num cassino, pra gente conhecer. Lá, ao contrário de todos os outros bares, estava bem cheio. Eu achei muito legal. Além das diversas máquinas de caça-níquel, haviam mesas para jogos de cartas (blackjack) e roletas. Os funcionários usavam aqueles uniformes que a gente vê em filme e tudo era meio avermelhado. Ah! E não tem janelas, pras pessoas perderem a noção de tempo (entra dia, sai dia e o pobrezinho tá lá, apostando a casa, o carro, a mãe, o cachorro). Outra coisa interessante é que não é permitido tirar fotos, pra garantir a privacidade dos apostadores. Eu tirei uma foto, mas bem rapidinho, só pra ser xingada e ter pelo menos um registro. Na parte mais distante das mesas de apostas tem um restaurante e um bar com palco, onde ficamos. Estava tendo um show de um trio que tocava umas milongas, cumbias e tangos. Muito bacana. A cerveja aqui parece até que é tabelada. Em todo lugar que vamos pagamos 9000 guaranis, independende do grau de requinte da balada, do bar ou do pub. Claro que se formos comprar num mercado ou um supermercado é bem mais barato, mas fora é sempre o mesmo preço.

Existe aqui perto uma cidadezinha bem interiorana que se chama Areguá. Sábado nós fomos conhecê-la, pois estava rolando a feira anual do morango. Era uma feirinha muito bacana, com barraquinhas em fila indiana, no meio da estrada,vendendo morangos (obviamente) e uma porção de derivados: morango com chantilli, torta de morango, mousse de morango, bolo de morango, bombom de morango, chupa-chupa de morango, licor de morango, sorvete de morango, suco de morango, marmelada de morango, alfajor de morango e geléia de morango. Já deu pra perceber que maravilha que foi a brincadeira. Tudo muito delicioso, absurdamente bem feito e barato. Saimos de lá passando mal de tanto morango que consumimos. Tivemos a impressão que movimentamos bruscamente a economia da feirinha, pois ficamos numa gastação incrível, experimentando de tudo um pouco. Só o suco eu repeti três vezes...hummmm, delícia! Tomara que sábado que vem apareça uma feira do limão,do figo ou do maracujá.

2 comentários:

Lívia Aguiar disse...

noh, feira do maracujá ia ser MARA!

Nina Senra disse...

E aí? Apareceu a outra feirinha de fruta já? :)
(imaginei direitinho as barraquinhas em fila indiana na estrada!)